quarta-feira, 18 de março de 2009

Canal do Panamá - março/2009

Chegando a marina Shelter Bay reencontramos nossos grandes amigos Marcelo e Maura do Gardian, Bob e Bel do Bicho Vermelho, Valdo e Cláudia do Jasmim e poucos dias depois chegam o Hugo, Gy e Talita do Beduína, Bruno, Lu e Bernardo do Caribee e Diogo e Flávio do Itusca. Assim, com o Pajé somamos 7 veleiros brasileiros. Não tenho certeza, mas deve ser um recorde de brasileiros em Colon! Como era de se esperar a vida social ficou intensa, com muitos churrascos, jantares e confraternizações. Alguns preparando-se para atravessar o canal e outros para ficar pelo Atlantico. Muito divertido e instrutivo. Todos se ajudam. O Marcelo nos deu uma super ajuda com nosso guincho e carregador de baterias. O Diogo e o Flávio ajudaram a todos com os laptops e softwares. A Paula ensinou às meninas a receita do seu já famoso cheesecake. A Bel nos ensinou a fazer conservas e a Maura nos deu os potes que não conseguíamos achar por aqui. A Lu, sempre brincalhona e a disposição para ajudar. O Bob tomava conta da grelha nos diversos churrascos. Uma das raras exceções por aqui sou eu, que incompetente e preguiçoso não tenho muita utilidade pra ninguém... Paciência, fico aqui escrevendo bobagem.


Os preparativos são febris e é curioso observar: durante o dia ninguém se vê muito, apenas para a ocasional ida a um barco ou outro para pedir ou perguntar alguma coisa ou para ajudar numa tarefa mais complexa. Ou no meu caso, ir encher a paciência dos amigos com gracinhas fora de hora. Alguns se agrupam para expedições aos supermercados, lojas, oficinas, autoridades panamenhas e afins. Por conta disso Bob e eu tivemos longos e românticos passeios agarradinhos na moto dele. Mais pro finalzinho do dia começam as articulações sociais: bebidinhas no barco de um, jantar no barco do outro, churrasco no gramado, troca de mazelas e soluções. Um barato. Provisões, manutenção (rádio VHF, motor do guincho, carregador de baterias, filtros, etc. etc. etc.), cartas náuticas, guias, embaixadas, medições para o canal, peças de reposição. Acaba se tornando um ciclo: fases de muita curtição são seguidas por fases de muito trabalho que nos preparam para a próxima fase de muita curtição.
E o melhor, sempre, são as amizades que vão surgindo e se fortalecendo. Definitivamente as coisas acontecem de uma maneira diferente de quando estamos nas cidades. Alguém pode estar completamente atolado de coisas pra fazer, no meio de uma tarefa fundamental e não hesita em parar tudo e ir lá ajudar o outro que também está num apuro. O que você faz ou fez para ganhar dinheiro (e o quanto ganhou) não faz a mínima diferença. As pessoas se gostam por que se gostam e pronto! Entre os mais queridos estão aqueles sempre disponíveis para ajudar e com um sorriso no rosto. Obviamente nessa vida também se encontra gente com quem o santo não bate, mas é bem mais simples se manter afastado delas: basta ancorar em outro lugar.

Nossos objetivos nessa parada em Colon eram o transito do Canal do Panamá e os preparativos para a travessia do Oceano Pacífico, quando deveremos navegar algo em torno 900 milhas até as Galápagos e depois mais umas 3000 milhas até as Marquesas, ou seja, 20 e poucos dias sem avistar terra. E olha, dá pra dizer que se gasta pelo menos um dia de preparação para cada dia de navegação...

A marina foi esvaziando: Caribee e Jasmim rumaram para Belize e depois EUA. Itusca e Beduína cruzaram o canal. Muitas despedidas e choramingos. Aquela vontade de conviver mais com os novos amigos. Pajé ficou pronto e também veio pro Pacífico. Maura e Marcelo soltaram nossas amarras, todo mundo com os olhos marejados. Gardian no dia seguinte partiu rumo a Cartagena e Curacao. Bicho seria o último a deixar a marina, apagar as luzes e rumar ao Pacífico.


O canal do Panamá é uma daquelas obras que vale a pena. Desde o remoto ano de 1534 os espanhóis já sonhavam com a possibilidade, mas 3 séculos se passaram até que em 1879 os franceses, confiantes com o sucesso do canal de Suez , concluíssem um acordo com o governo da Colombia para a construção do canal. 20 anos e 20 mil vidas perdidas depois a empreitada fracassou perante as doenças e dificuldades técnicas. Alguns anos se passaram e o governo dos EUA comprou os direitos sobre o canal e iniciou-se uma discussão com o governo da Colombia sobre taxas e comissões... Em 1903, veja só, o estado do Panamá declara independência da Colombia e é prontamente reconhecido adivinhem por quem? Assim, com o esforço de mais de 75 mil pessoas e 10 anos de trabalho foi construído o canal. O controle da febre amarela e malária foram fundamentais para o sucesso da obra. O canal iniciou suas operações em 1914 e já foram realizados mais de 850 mil trânsitos desde então. A partir do ano 2000 o canal passou ao controle do governo panamenho e continua em obras de expansão. Basicamente o canal é formado por 3 eclusas de cada lado, que elevam os barcos cerca de 26 metros até a altura do lago Gatún (criado pelo represamento do rio Chagres), onde se navega por 20 e poucas milhas até as eclusas do outro lado. Muitos pensam que os oceanos têm alturas diferentes, mas isso não ocorre. As eventuais diferenças de altura dos níveis são causadas pelas marés, muito mais intensas do lado Pacífico aonde chegam a 5 metros de variação. As eclusas servem para elevar os barcos ao nível do lago Gatún e trazê-los de volta ao nível do mar. São construções enormes, com mais de 30 metros de largura e 300 de comprimento, cada uma elevando ou baixando as embarcações por mais de 8 metros.
O transito do canal inicia-se com a ida ao escritório administrativo e agendamento da medição. Em seguida um medidor inspeciona o barco e preenche um questionário com informações gerais como velocidade máxima, autonomia e outras. Calcula-se a taxa (no caso do Pajé US$ 609), paga-se e depois, por telefone, agenda-se a data (no nosso caso, sexta feira, 13, porque gostamos de viver perigosamente). Tudo muito simples e eficiente. Para a travessia são necessários 4 cabos de no mínimo 40 metros de comprimento e 4 “line handlers”, as pessoas que operam os cabos dentro das comportas. Além disso, os veleiros se enchem de pneus velhos de ambos os lados para proteção contra qualquer manobra desastrada.
A Paula e eu fizemos o transito como line handlers do Kalida alguns dias antes pra ganhar alguma experiência e valeu à pena, na nossa vez estávamos quase calmos. Digo quase por que de fato é uma experiência impressionante. É tudo gigantesco e você se sente bem pequenininho amarrado a outros 2 veleiros no meio daqueles paredões. Em geral os veleiros transitam acompanhados de navios, mas demos sorte e fizemos todas as eclusas somente com os outros 2 veleiros. Tudo muito tranqüilo e seguro. Pouco antes de se entrar nas comportas os veleiros se amarram uns aos outros e o barco do meio é que usa seu motor para tocar a “jangadona” pra frente. Os barcos nas laterais mantêm seus motores ligados o tempo todo e eventualmente ajudam numa ou outra correção de rumo. Ao se entrar no canal de acesso são lançados 4 cabos guia, dois para cada um dos veleiros nas laterais. Esse é um dos momentos chave, ficam todos ligados para apanhar os cabos direitinho e não dar nenhum vexame. A Paula, pra variar, pegou dois cabos ainda no ar e foi aquela farra, todo mundo assoviando e aplaudindo nossa marinheira esperta. Os guias são amarrados nos grossos cabos de 40 metros de comprimento e devolvidos a terra. Quando os barcos estão posicionados e amarrados as comportas se fecham e começam a encher. Esse é o momento de maior emoção: os barcos vão subindo rapidamente (oito metros em 10 a 15 minutos) e os line handlers vão mantendo os cabos esticados para ninguém bater nos paredões. A água fica bastante turbulenta e os cabos trabalham bem. Os line handlers do Pajé (Bob e Bel, Paula e Frank) foram impecáveis. Um dos barcos perdeu um dos cabos, mas sem maiores conseqüências, conseguiram recuperar a tempo e deu tudo certo. Chegamos ao lago Gatun quase meia noite, amarramos o Pajé a uma bóia, celebramos o sucesso do primeiro trecho e dormimos exaustos. No dia seguinte caímos na água bem cedinho, para um banho na refrescante água doce do lago. Alguns não entraram na água, não sei se por medo da água fria ou dos jacarés... A navegada até as comportas do Pacífico foi muito tranqüila, estávamos com tempo de sobra e o dia lindo. O Ricardo, nosso prático era muito simpático e a Paula foi abarrotando todo mundo de comida. A descida também foi sem sustos, apesar do veleiro do outro lado ter ficado sem motor. Imagino a aflição do cara. A emoção maior foi por conta da webcam e da gente agitando a bandeira brasileira para as famílias assistindo em casa. O Frank abriu a champagne que havia trazido e iniciamos os brindes.


-Flamenco signal, Flamenco signal, sailing yacht Pajé.
-Sailing yacht Pajé, this is Flamenco signal.
- We just finished the canal transit and request permission to proceed to La Playta anchorage.
-OK, please clear channel as soon as possible.
-OK, thanks.
E, olha só, Pajé no Pacífico!

9 comentários:

  1. Amor da Mami,
    O que é bom dura pouco,mas...
    O valor das coisas não esta no tempo que elas duram,mas na intensidade com que acontecem.
    Por isto existem momentos inesqueciveis,coisas inexplicaveis e pessoas incomparaveis como vc minha filha.
    Tbem adorei brincar com o Ali,garoto inteligente,esperto,e muito doce,sempre me chamando de dona Eraci.
    Meu adoravel Mario,sempre irreverente,proporcionou momentos hilários,Valeu,elefantinho,rsrsrs.
    Saudade tbem da Gretchem do frank,e do Luk meu chodó.
    Espero reve-los em breve. sei que meu genro não aguentaria ficar tanto tempo sem mim,rsrsrsr

    filhinha te amo se cuida, mami
    Mario, bjs se cuida,te amo
    Gretchem bjs se cuida,te amo

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  2. Have a great trip!
    -Rolf (Gretchen's brother)

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  3. Ana Paula,

    Acho formidável o seu jeito de viver e encarar a vida. Gostei muito do seu blog com a nossa Mami.

    Felicidades e boa travessia.

    Beijos da pessoa que te admira muito.

    Adriana De Nigris

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  4. lindas as fotos.. amei! estav mesmo sentindo falta dos seus posts...
    tem um selo em meu blog de divulgação do dia mundial da água, divulgue esta ideia.

    abraços
    Ivany

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  5. Oi minha Querida Irmazinha oi Cunha Lindão,

    Sempre acabo ficando emocionada, quando posso ler tudo o que vocês estão,
    vivenciando. Dá até arrepios! Parece que estamos juntos. E olha que foi quase isto mesmo, era um tal de
    iridium para cá, outro pra lá, foi ótimo. Não canso de dizer o quanto "Te Amo minha irmazinha" e o quanto
    estou feliz com a suas descobertas dia-a-dia, desta nova vida, que já posso dizer que é velha né? Faz um tempão já!
    Quantos amigos queridos que vocês ganharam! Lindos e muitos carinhosos. Fico mais tranquila pois sei que vocês estão em
    boa companhia. A passagem da Mãe pelo Pajé foi incrível. Imagina as histórias que ouvimos quando nossa Loirinha, chegou em terras Brasileiras.
    Minha querida, estarei com vocês em pensamento, em coração, acompanhando vocês nestas megas aventuras. Se cuidem, boa travessia e não deixem de mandar recados. Cunha, cuida da minha pequena. Amo vcs. Se cuidem....... mil beijos.

    TE AMOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOO

    Sua irmazinha e sua cunhadinha coisa fofa! Rs rs rs


    Simone S. M. Prestes
    simone.santalla@uol.com.br

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  6. Paula e Mario

    A cada contato, histórias de vocês, fico mais encantando com este espirito aventureiro, corajoso, e principalmente pela história de vocês....

    Não vejo a hora, de ler o livro sobre estas aventuras, romances (espero que esteja nos planos...)

    Queria ter a coragem de vocês, em simplesmente saber como VIVER !!!

    Abs e Bjs

    Bauke

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  7. olá, que coisa linda!!! por aqui sempre é fascinante passar e deliciar-se com sa fotos e as palavras...

    bjocas

    esta sabendo da hora do planeta, hj as 20:30 apague as luzes por uma hora da sua casa, onde vc estiver... participe!!! o planeta agradece.

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  8. Paulinha e Mário,
    Nada como umas boas férias para poder ler com calma todas as aventuras! Essa da travessia do Canal está entre as top 5, com certeza!! Pena que perdi o momento ao vivo!! Deve ter sido realmente incrível...
    O mais legal é ver as amizades se formando... adorei seus últimos posts, Mário.
    Beijos,
    Gabi (Birus)

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  9. Alou casal por aí...

    Tô pensando em criar mais uma seção no blog do MaraCatu com receitas e dicas gastronômicas. Fiquei curioso e com água na boca pensando como é o já famoso cheesecake de Paula.
    Se não for pedir muito, dá pra me mandar a receita por e-mail com uma fotinha da mestre cuca em ação?
    Um cheiro e bons ventos sempre,

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