sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Aitutaki - setembro/09


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Ancorados bem próximos Beduina, Matajusi e Pajé curtiam sozinhos o motu Taurere, na ponta sudeste de Bora Bora. Estava difícil sair, um dia mergulho, no outro kite,e no outro o aniversârio da Gislayne, depois a previsão do tempo e assim fomos ficando. As baguetes e acesso a internet também ajudavam...

Veio uma semana com uma excelente previsão de tempo para a velejada até as ilhas Cook. Enrolamos mais um pouco, compramos mantimentos e mudamos para uma ancoragem próxima ao passe. Nesse meio tempo vimos o Milo One navegando pelo lagoon e conseguimos trocar algumas palavras, uma pena que nos desencontramos, vai se saber agora quando voltaremos a nos ver, já que eles ficam mais um ano pela polinésia francesa.

A grande maioria dos veleiros já partiu pra Tonga ou Samoa, via alguma das ilhas Cook. Depois de muita conversa entre nós três retardatários decidimos rumar para Aitutaki, 500 milhas a sudoeste. Cook Islands é um país independente, com quinze ilhas dispersas por uma área de mais de 2 milhões de km quadrados. Possui cerca de 19 mil habitantes e uma série de acordos políticos e econômicos com a Nova Zelândia, de quem depende muito. A maior parte da população é descendente de polinésios.

A previsão de tempo indicava ventos favoráveis entre 15 e 20 nós, diminuindo com o passar dos dias. Saímos perto do meio dia e o vento foi aumentando. Mar desencontrado, com ondas vindo pela popa e través, e os barcos sambando de acordo. Nos dois primeiros dias e noites ainda tivemos os desagradáveis pirajás, cheios de chuva e rajadas. Daí em diante o vento abrandou e a navegada tornou-se um prazer. O Matajusi um pouco à frente, Beduína e Pajé praticamente lado a lado com freqüentes contatos pelo radio VHF. Pelo radio SSB a brasileirada também se fala diariamente, a idéia é que todos nos reencontremos em Tonga.

Navegamos por quase 4 dias e chegamos a Aitutaki motorando lentamente, esperando o dia clarear para podermos escolher uma ancoragem do lado de fora da barreira de coral. O passe daqui é muito raso e não comporta nosso calado. Assistimos invejosos e balouçantes o Beduína (catamaran com meros 1,10 m de calado) passar por nós e ancorar confortavelmente dentro do lagoon. Cá fora, um sofrimento: fundo de coral, profundidades superiores a 12 metros e o vento mantém os barcos de lado para a ondulação. Extremamente desconfortável, além do perigo de estarmos a poucos metros do coral. Percebemos imediatamente que noites insones estavam a caminho, mas afinal, o que é mais uma pintinha para um dálmata?

Conseguimos colocar bote e motor de popa na água depois de alguns bem ensaiados malabarismos e fomos pegar o Silvio e a Lilian. O passe é casca– estreito, raso, curvo, com muita correnteza e ainda nos reservaria muitas emoções.

Questões burocráticas resolvidas demos uma volta pelas imediações e combinamos as atividades vindouras: mergulhos, passeios de bote, aniversários do Hugo e Silvio, etc. Agenda cheia.

O mergulho próximo ao Pajé valeu pela água maravilhosa e pelos corais, que formavam vales com fundo de areia entre eles. Investigando os vales e tocas não vimos nada de mais. O Silvio ainda pegou umas conchas para comer, mas o Pajé deixou passar. Outros velejadores nos disseram que havia ciguatera por aqui, então não rolou peixinho também, e acreditem, não vimos nenhum tubarão!
Mas vimos baleias, por vezes nadando a menos de 20 metros do barco. Falar o que? O bicho é de fato impressionante, mas o legal mesmo é observar a alegria e entusiasmo da Paula, fica tão emocionada o meu amor...
Com os botes chegamos a um motu – Honeymoon island– nos confins do lagoon. Ah, mas não fomos desprevenidos, levamos o kite e velejamos no melhor pico (sem ondas) que já vimos até agora. Uma área enorme, rasa, com fundo de areia sem pedras ou coral pra atrapalhar, aquela água cor de paraíso. PQP, duca!!! E Hugo, meu empolgado (nem tão) jovem aprendiz, conseguiu velejar. Que presentão de aniversário: primeira velejada de kite e num lugar desses.

Vimos uma moréia morta com um baiacu inchado na boca, imagine a surpresa dela, morder o almoço e ele começar a inflar. Mas pensando bem, antes assim, a moréia ao menos teve um fim digno. E se o baiacu, com aqueles espinhos todos, resolvesse inchar na saída ao invés da entrada? Indigno e dolorido, ui.

E nada como a idade e convivência para desmascarar as pessoas. Na festa de aniversário dupla descobrimos que o Hugo é um ET, veja a foto. E a Talita também, olha só o pé dela. Que a Gislayne não é humana a gente já sabia...


Apesar das recentes descobertas alugamos um mini carro ultrahiperextra compacto em sete pessoas. Parecia àquelas competições de quantas pessoas cabem num fusca. Colocamos as pranchas e alguns amigos no teto e fomos fazer um passeio pela ilha. Foi de tirar o fôlego. Não só pelos morros íngremes que escalamos, mas principalmente pelas paisagens deslumbrantes. Lindo, lindo, lindo. Para nós, o lugar mais bonito que já visitamos.



E o povo, como todos os polinésios, é muito simpático. Fomos a um jantar show em um dos motus do lado leste da ilha. A comida deliciosa foi seguida de um show típico. Não consigo deixar de me impressionar com o ritmo da música e da dança daqui. A maneira como os homens mexem as pernas, agachados, com os tornozelos juntos e a sensualidade com que as mulheres requebram os quadris, dançando na ponta dos pés é de cair o queixo. Vejam sò, nem pareceu descrição de uma dança, ficou mais pra aula de anatomia...


Por sorte, havia um grupo de canto e dança da Nova Zelândia passando uns dias em Aitutaki e eles também fizeram uma apresentação. Um estilo diferente que nos deixou muito impressionados ao iniciarem com brados de guerra, batidas de pé e olhares furiosos. E o tamanho dos caras (homens e mulheres) então? Olha, não devia ser mole enfrentar essa turma não...

Depois cantaram e dançaram diversas canções tão doces e alegres que não parecia possível serem as mesmas pessoas. Fascinante. Apesar de espalhados por uma área imensa do oceano pacifico, com suas ilhas distantes invadidas e colonizadas por diferentes nações, os polinésios conseguem manter uma identidade étnica e cultural admirável. Tremendo contraste com o Brasil, território continuo em que tantas etnias e tradições se misturam e/ou convivem.

Tarde naquela noite, a volta de bote tateando no maior breu para achar o passe, evitar os corais, vencer a correnteza e voltar ao mar aberto até que não foi tão difícil. Difícil foi achar o Matajusi com suas luzes apagadas. Um dia emocionante do começo ao fim.

Só não gostamos de duas coisas em Aitutaki: ancorar do lado de fora do passe e pagar mais de duzentos dólares de taxas de alfândega, ancoragem, partida, etc. Desancorar também foi um perrengue e diversos mergulhos foram necessários para safar a ancora dos corais. Próximo destino: Beveridge reef.



quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Bora Bora - setembro/09


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A velejada até Bora Bora começou bem preguiçosa, a sotavento de Tahaa. Mas quando saímos da proteção das montanhas vento e mar aumentaram. As ondas ficaram especialmente confusas, vinham pelos dois lados da ilha e ainda se espremiam no canal que separa Tahaa de Bora Bora. O vento chegou aos 25 nós e ao contornarmos aponta sudeste de Bora Bora algumas rajadas atingiam 30 nós. Mas estava um belo dia de sol e não dava pra reclamar, só 20 milhas a serem navegadas.







Há um único passe que permite a entrada no lagoon. Os imponentes montes Pahia e Otemanu dominam a paisagem e são visíveis por toda a ilha, inteiramente cercada por um enorme lagoon cuja água assume centenas de tons de verde e azul. As nuvens mais próximas ficam tintas de verde pelo reflexo da água. Até mesmo a barriga branca dos pássaros fica colorida. Diversos motus com areia branquíssima (agora apinhados de hotéis com seus bangalôs sobre a água) completam a paisagem. Em diversos locais ao redor da ilha percebe-se nitidamente o formato da cratera do vulcão que a originou. Dizem que Bora Bora é a ilha mais bonita do mundo...

Por aqui também os indefectíveis remadores e suas pirogas com flutuadores laterais. Em todas as ilhas que visitamos na Polinésia francesa os avistamos, certamente é um dos esportes prediletos. Os polinésios são em geral muito fortes e vigorosos, capazes de remar velozmente por horas. Fica fácil entender como no passado os visitantes dessas ilhas se assustavam com a aproximação destas canoas. Fica fácil também entender os nativos de outrora e suas crenças. Imagine uma montanha portentosa no meio da ilha, um monolito espetado no céu e que fizesse os ventos ficarem mais fortes a sua volta. Hoje sabemos que os ventos aceleram ao descer a encosta das montanhas, mas na época só dava pra achar que era coisa dos deuses mesmo.

Ancoramos em diversos lugares, demos nossa tradicional voltinha de moto, velejamos de kite e mergulhamos de novo (bocejo) com tubarões. Tivemos chuva, sol, ventão e calmaria. Encontramos o Silvio e a Lilian do Matajusi, brasileiros que também estão velejando por aí e já conhecíamos por email. Hugolino Bedu progride no kite a olhos vistos para orgulho da família e vizinhos. O Silvio se empolgou e também entrou na dança. Na fila: Talita e Gislayne.

Celebramos com pompa e circunstância o aniversário de trocentos anos de Dona Gislayne. Presentes, bolo, brigadeiro, salgadinhos (teve até coxinha e risoles), parabéns a você e um dueto das flautas de Talita e Silvio, um luxo!

Gostaríamos de ficar mais tempo por aqui, mas as regras de imigração não o permitem e, com a aproximação da estação dos ciclones, todo mundo está se mandando para lugares onde eles não passam. Nossos companheiros Bicho, Canela e Itusca já estão nas ilhas Cook . E é para lá que vamos Beduína, Matajusi e Pajé. A previsão do tempo está boa e queremos aproveitar, são 500 milhas até lá. Boas novas, já que ninguém terá que agüentar meu besteirol por um bom tempo.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Raiatea & Tahaa - agosto/09


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Raiatea e Tahaa são duas ilhas que compartilham a mesma barreira de corais e ficam bem ao lado de Huahine - 20 milhas. Saímos pela manhã com um ventinho favorável que, como de praxe, virou contra no final. Os ventos por aqui são muito variáveis, uma surpresa. Esperávamos alísios constantes como o NE brasileiro ou o Caribe, mas aqui nessa época não vimos uma semana inteira com o mesmo vento. Sempre entra uma pauleira ou outra, o mar cresce e o tempo fica encoberto. Por vezes ficamos presos numa ilha uma semana esperando o tempo melhorar para navegarmos até a próxima. Se há chuva ou o céu está encoberto os lugares perdem um pouco da sua beleza, a água não fica com todos aqueles tons e cores. E se o vento está muito forte nos preocupamos com o barco e os passeios em terra são prejudicados.


Nossa estada em Raiatea e Tahaa sofreu um pouco com os fatores acima, não pudemos aproveitar tudo que as ilhas oferecem. Mas alguma coisinha a gente sempre acaba fazendo...

Uma volta por Raiatea nos deixou com os popos dormentes e exaustos, afinal 100 km em cima de uma minimoto são de arrebentar até os fundilhos mais resistentes.


Este doloroso dia valeu pela visita a um Marae (local onde antigamente os polinésios realizavam diversas de suas cerimônias político-religiosas) a beira-mar. Raiatea possui uma grande quantidade destas ruínas por ter sido a ilha dominante nestes cerimoniais. A que visitamos, além de ocupar uma vasta área, está muito bem preservada. Como o local todo é muito bem cuidado e com placas explicativas torna-se um passeio agradável e instrutivo.


A outra aventura foi tirar os barcos (Beduína, Bicho e Pajé) do lugar onde havíamos atracado: um cais publico bem apertadinho. Claro que no dia que queríamos sair entrou um ventão que espremeu todos contra a parede e, com barcos por todo lado, ficou muito difícil manobrar. O bote do Pajé virou rebocador e nos safamos intactos, sem máculas a reputação náutica brasileira.




A previsão de tempo só mostrava ventão, fizemos do limão uma caipirinha: fomos a um motu apropriado e acabamos com nosso jejum kitístico! Desde o Panamá não velejávamos, como pode? Morar a bordo, viver no mar e ficar quase seis meses sem velejar de kite... Não dá pra explicar. Mas as fotos devem mostrar como foram os poucos dias que passamos ancorados em Mahea. Irados!


Mas o vento continuou a aumentar, o tempo fechou e a ancoragem ficou muito desconfortável. Decidimos nos abrigar do outro lado de Tahaa onde ficamos entocados no Pajé, já que nossos sofridos bumbuns não queriam mais saber de passeios de moto. Muita leitura, internet, jantares e jogatinas com os vizinhos Beduínos. Dias a frio com chuva e vento uivando lá fora, acredite se quiser! Inverno, negão...


Dizem que cabeça vazia é morada do diabo, que o ócio é o pai de todos os pecados, etc. Numa segunda-feira chuvosa, enfurnado, tive momentos de indescritível prazer sádico ao enviar para alguns grandes amigos um email intitulado “segunda-feira”, sem nenhum texto, apenas algumas fotos das sessões de surf em Huahine e kite em Mahea. Já que os caras nunca me escrevem nem dão bola, achei justo. Foi o suficiente para responderem com uma rapidez nunca dantes vista. As respostas, sem exceção, continham toda espécie de protestos, xingamentos e palavrões. Bingo! Nada como bons amigos...

Certa manhã o vento deu uma trégua e fomos embora pra Bora Bora (uia, outro trocadilho tão infame que encerro aqui para o seu devido deleite). Em breve, mais afrontas ao bom gosto literário.