domingo, 18 de outubro de 2009

Niue - outubro/09


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Niue, a 120 milhas de Beveridge reef, é uma ilha formada inteiramente por coral. Seu ponto mais alto não passa de 100 metros. Não possui rios ou lagos e toda chuva é rapidamente filtrada pelo solo poroso até o mar, que permanece transparente e cristalino. Apesar disso, seus 269 km2 são recobertos por abundante vegetação. Menos de 1600 pessoas habitam a ilha, que é um país independente, mas com fortes conexões com a Nova Zelândia.

Usamos uma poita colocada a mais de 30 metros de profundidade. Do convés podíamos ver o fundo, poita, corais e peixes! Dentro da água a visibilidade ultrapassava facilmente os 50 metros. Descer pelo cabo até a poita logo se tornou um dos passatempos preferidos. Ter fôlego foi uma vitória, mas o difícil foi vencer a pressão, os pulmões ficam tão espremidos que a gente quase não consegue achar ar para fazer a compensação.


Baleias comumente passeiam pela ancoragem. Certa noite uma mãe e seu filhote passaram tão perto que nos molharam com seus borrifos. Juro! Podem perguntar pro pessoal do Beduína que estava bem ao lado.

Como não existem ancoragens abrigadas em Niue o desembarque é feito em um píer de concreto. Um guindaste retira o bote da água, numa manobra no mínimo emocionante, principalmente se o swell está um pouquinho maior. Aí também fica ruim para dormir, mas por sorte só tivemos algumas horas nessas condições. A maior parte do tempo foi um sossego.


Havia uns 14 veleiros por lá e todos marcaram presença no trimaran Migration para o aniversario do Bruce, que foi homenageado com uma canção composta especialmente para a ocasião e cantada em coro pelos presentes, muito bacana. Comida, bebida, música e conversa. Viva os barcos espaçosos.


Alugamos um carro com nossos vizinhos, dessa vez demos sorte, pois apesar de termos pago por outro ultraextrahipermini compacto a moça foi super simpática e nos cedeu uma van enorme, super espaçosa. Claro que eu e Hugo aproveitamos a oportunidade e dissemos as nossas amadas que o importante era o conforto delas e nem dávamos bola para dinheiro...


Em terra, as atrações de Niue são as imensas cavernas submarinas e a beira-mar, os incríveis penhascos e as maravilhosas piscinas naturais entre as formações coralíneas. As fotos da Paula contam melhor.

Em breve, mais blábláblá e fotos direto do Reino de Tonga.


sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Tsunami e Beveridge Reef - outubro/09


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Beveridge reef é uma das mais remotas e inóspitas ancoragens do Pacifico, tao perdida que nao aparece nem no Google maps. Um banco de corais a flor d’água, quase circular, com um único passe para dentro do lagoon. Uma lagoa no meio do oceano, já que o coral, apesar de semi-submerso, quebra a força das ondas, proporcionando uma ancoragem relativamente confortável. Mas antes de chegar lá novas e fortes emoções nos aguardavam...

Desancoramos ao final do dia em Aitutaki e fomos dormir boiando ao largo da ilha, esperando o Beduína para seguirmos viagem juntos na manhã seguinte. O Matajusi já zarpara.

As 450 milhas até o reef foram percorridas no maior sossego, com mar calmo e vento fraco, o que nos levou a motorar para chegarmos ao passe num horário adequado. Pela manhã, prestes a entrar no lagoon recebemos uma ligação no Iridium (telefone via satélite) do Marcello e Mariana, do Saravá. Eles e o Bicho Vermelho tinham acabado de passar por um tsunami em Tonga. Como sabiam dos nossos planos de ir a Beveridge reef resolveram nos avisar. Tremenda presença de espírito de Bel, Bob, Mariana e Marcello. Afinal, havia a possibilidade de uma grande onda se criar ao encontrar as águas rasas do recife.

Bom, dá pra imaginar o que foram as horas seguintes... Chamamos pelo radio VHF o Canela e Matajusi que já estavam com outros veleiros dentro do lagoon. Enquanto esses barcos preparavam-se para abandonar o local iniciou-se uma frenética busca por maiores informações via radio SSB, pois a essa altura pouco se sabia. Aos poucos fomos entendendo melhor a situação: um forte abalo submarino (8.3 na escala Richter) havia ocorrido a apenas 350 milhas de onde estávamos. O tsunami resultante causou grandes danos em Samoa e atingiu também diversas outras ilhas. Alertas foram emitidos para todo o Pacífico. Quando recebemos a ligação a onda já tinha passado por nós. Os tsunamis se movimentam a uma velocidade espantosa, 500 milhas por hora, velocidade de um avião comercial a jato.

Por estarmos em águas muito profundas não sentimos nenhum efeito. O mesmo para os barcos que estavam dentro do recife, apesar de estarem em águas rasas. Já Bicho e Saravá sentiram os efeitos da violenta variação da maré. Mas todos os barcos brasileiros por aqui saíram ilesos, ainda bem. No blog do Maracatu tem o relato da Bel para quem quiser ler mais a respeito.

Mas essas coisas sempre acabam tendo um momento cômico: enquanto esta historia toda se desenrolava, ficamos ao largo do recife, pois queríamos muito conhecê-lo, mas não nos sentíamos seguros sob a ameaça de maremoto. Todos os barcos saíram de lá e foram pra Niue, exceto Matajusi e Pajé, ainda indecisos. Nessa dúvida toda de fica-não-fica falávamos constantemente pelo radio com o Hugo, ainda a caminho. Homem decidido que só, numa dessas ele solta a pérola: “por que se eu for aí, não quero nem saber, não vou esperar não, vou entrar, ancorar e pronto”. Macho!
Pouco tempo depois o alerta foi cancelado e ancoramos os três, com o impensável Beveridge reef só para nós. Valeu, o lugar é realmente único. 360 graus à volta aquele marzão quebrando, espuma pra todo lado e você ali, ancoradinho naquela piscina. A água é estupidamente clara e fomos mergulhar, claro.

Visitamos um barco pesqueiro naufragado recentemente e fomos procurar algo pro jantar. Um tubarãozinho galha branca deu bobeira e virou moqueca nas mãos hábeis de Gislayne. Tenho tentado provocar uma rivalidade culinária entre a Paula e a Gi. Apesar de não muito correto (podem me acusar de torpe), nesse caso creio que os fins justificam os meios: pratos cada vez mais elaborados e deliciosos.
Tsunami e tubarão na bagagem, levantamos ancoras rumo a Niue, Beduína e Pajé levando consigo as poderosas Paulinha Tsunami e Gigi Furacão, duas forças da natureza. Se não der certo o restaurante, vamos de grupo de axé mesmo...

Aitutaki - setembro/09


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Ancorados bem próximos Beduina, Matajusi e Pajé curtiam sozinhos o motu Taurere, na ponta sudeste de Bora Bora. Estava difícil sair, um dia mergulho, no outro kite,e no outro o aniversârio da Gislayne, depois a previsão do tempo e assim fomos ficando. As baguetes e acesso a internet também ajudavam...

Veio uma semana com uma excelente previsão de tempo para a velejada até as ilhas Cook. Enrolamos mais um pouco, compramos mantimentos e mudamos para uma ancoragem próxima ao passe. Nesse meio tempo vimos o Milo One navegando pelo lagoon e conseguimos trocar algumas palavras, uma pena que nos desencontramos, vai se saber agora quando voltaremos a nos ver, já que eles ficam mais um ano pela polinésia francesa.

A grande maioria dos veleiros já partiu pra Tonga ou Samoa, via alguma das ilhas Cook. Depois de muita conversa entre nós três retardatários decidimos rumar para Aitutaki, 500 milhas a sudoeste. Cook Islands é um país independente, com quinze ilhas dispersas por uma área de mais de 2 milhões de km quadrados. Possui cerca de 19 mil habitantes e uma série de acordos políticos e econômicos com a Nova Zelândia, de quem depende muito. A maior parte da população é descendente de polinésios.

A previsão de tempo indicava ventos favoráveis entre 15 e 20 nós, diminuindo com o passar dos dias. Saímos perto do meio dia e o vento foi aumentando. Mar desencontrado, com ondas vindo pela popa e través, e os barcos sambando de acordo. Nos dois primeiros dias e noites ainda tivemos os desagradáveis pirajás, cheios de chuva e rajadas. Daí em diante o vento abrandou e a navegada tornou-se um prazer. O Matajusi um pouco à frente, Beduína e Pajé praticamente lado a lado com freqüentes contatos pelo radio VHF. Pelo radio SSB a brasileirada também se fala diariamente, a idéia é que todos nos reencontremos em Tonga.

Navegamos por quase 4 dias e chegamos a Aitutaki motorando lentamente, esperando o dia clarear para podermos escolher uma ancoragem do lado de fora da barreira de coral. O passe daqui é muito raso e não comporta nosso calado. Assistimos invejosos e balouçantes o Beduína (catamaran com meros 1,10 m de calado) passar por nós e ancorar confortavelmente dentro do lagoon. Cá fora, um sofrimento: fundo de coral, profundidades superiores a 12 metros e o vento mantém os barcos de lado para a ondulação. Extremamente desconfortável, além do perigo de estarmos a poucos metros do coral. Percebemos imediatamente que noites insones estavam a caminho, mas afinal, o que é mais uma pintinha para um dálmata?

Conseguimos colocar bote e motor de popa na água depois de alguns bem ensaiados malabarismos e fomos pegar o Silvio e a Lilian. O passe é casca– estreito, raso, curvo, com muita correnteza e ainda nos reservaria muitas emoções.

Questões burocráticas resolvidas demos uma volta pelas imediações e combinamos as atividades vindouras: mergulhos, passeios de bote, aniversários do Hugo e Silvio, etc. Agenda cheia.

O mergulho próximo ao Pajé valeu pela água maravilhosa e pelos corais, que formavam vales com fundo de areia entre eles. Investigando os vales e tocas não vimos nada de mais. O Silvio ainda pegou umas conchas para comer, mas o Pajé deixou passar. Outros velejadores nos disseram que havia ciguatera por aqui, então não rolou peixinho também, e acreditem, não vimos nenhum tubarão!
Mas vimos baleias, por vezes nadando a menos de 20 metros do barco. Falar o que? O bicho é de fato impressionante, mas o legal mesmo é observar a alegria e entusiasmo da Paula, fica tão emocionada o meu amor...
Com os botes chegamos a um motu – Honeymoon island– nos confins do lagoon. Ah, mas não fomos desprevenidos, levamos o kite e velejamos no melhor pico (sem ondas) que já vimos até agora. Uma área enorme, rasa, com fundo de areia sem pedras ou coral pra atrapalhar, aquela água cor de paraíso. PQP, duca!!! E Hugo, meu empolgado (nem tão) jovem aprendiz, conseguiu velejar. Que presentão de aniversário: primeira velejada de kite e num lugar desses.

Vimos uma moréia morta com um baiacu inchado na boca, imagine a surpresa dela, morder o almoço e ele começar a inflar. Mas pensando bem, antes assim, a moréia ao menos teve um fim digno. E se o baiacu, com aqueles espinhos todos, resolvesse inchar na saída ao invés da entrada? Indigno e dolorido, ui.

E nada como a idade e convivência para desmascarar as pessoas. Na festa de aniversário dupla descobrimos que o Hugo é um ET, veja a foto. E a Talita também, olha só o pé dela. Que a Gislayne não é humana a gente já sabia...


Apesar das recentes descobertas alugamos um mini carro ultrahiperextra compacto em sete pessoas. Parecia àquelas competições de quantas pessoas cabem num fusca. Colocamos as pranchas e alguns amigos no teto e fomos fazer um passeio pela ilha. Foi de tirar o fôlego. Não só pelos morros íngremes que escalamos, mas principalmente pelas paisagens deslumbrantes. Lindo, lindo, lindo. Para nós, o lugar mais bonito que já visitamos.



E o povo, como todos os polinésios, é muito simpático. Fomos a um jantar show em um dos motus do lado leste da ilha. A comida deliciosa foi seguida de um show típico. Não consigo deixar de me impressionar com o ritmo da música e da dança daqui. A maneira como os homens mexem as pernas, agachados, com os tornozelos juntos e a sensualidade com que as mulheres requebram os quadris, dançando na ponta dos pés é de cair o queixo. Vejam sò, nem pareceu descrição de uma dança, ficou mais pra aula de anatomia...


Por sorte, havia um grupo de canto e dança da Nova Zelândia passando uns dias em Aitutaki e eles também fizeram uma apresentação. Um estilo diferente que nos deixou muito impressionados ao iniciarem com brados de guerra, batidas de pé e olhares furiosos. E o tamanho dos caras (homens e mulheres) então? Olha, não devia ser mole enfrentar essa turma não...

Depois cantaram e dançaram diversas canções tão doces e alegres que não parecia possível serem as mesmas pessoas. Fascinante. Apesar de espalhados por uma área imensa do oceano pacifico, com suas ilhas distantes invadidas e colonizadas por diferentes nações, os polinésios conseguem manter uma identidade étnica e cultural admirável. Tremendo contraste com o Brasil, território continuo em que tantas etnias e tradições se misturam e/ou convivem.

Tarde naquela noite, a volta de bote tateando no maior breu para achar o passe, evitar os corais, vencer a correnteza e voltar ao mar aberto até que não foi tão difícil. Difícil foi achar o Matajusi com suas luzes apagadas. Um dia emocionante do começo ao fim.

Só não gostamos de duas coisas em Aitutaki: ancorar do lado de fora do passe e pagar mais de duzentos dólares de taxas de alfândega, ancoragem, partida, etc. Desancorar também foi um perrengue e diversos mergulhos foram necessários para safar a ancora dos corais. Próximo destino: Beveridge reef.