Recebemos a visita de Madame Adriana e Luis que sofreram bastante com o calor, a ausência de internet e contatos com a civilização. Como recompensa Adriana refrescou-se com proseccos e cavas e Luis com alguns vinhos da Toscana, seus preferidos, enquanto observavam estrelas do mar, peixes e arraias nadando ao redor.
Com a ausência de vento a água esta ainda mais transparente e do convés conseguimos constantemente ver o fundo e o que está acontecendo. Um dia tivemos um imenso cardume de sardinhas curtindo a sombra do barco. Outro dia havia dois imensos pargos passeando pra lá e pra cá. Deu certo trabalho mas consegui trazer um deles pra mestre cuca aprontar mais uma das suas. Comemos assado, grelhado, ensopado, moqueca. Conseguimos terminar com ele ontem, ou seja, estou liberado pra mergulhar e tentar espetar mais algum nos próximos dias.
Além dos peixes e arraias o mar nos trouxe outra surpresa – um cachorro! É, sabemos, difícil acreditar mas é verdade. Bem cedinho, lá pelas 10 (ahhh como é bom uma vida preguiçosa!) acordamos com uns barulhos estranhos no convés. Na investigação demos de cara com um vira-lata amedrontado que tentou de tudo pra passar despercebido. Descoberto, o tripulante clandestino foi devolvido a sua ilha de origem.
O mar também nos traz diariamente a visita da Mayelis, 2 anos de idade e que mora na ilha aqui ao lado. Ela vem sempre sorrindo, cheia de tchauzinhos e beijinhos buscar suas balinhas e doces. Os pais e avós disseram que ela passa o dia esperando o momento de nos visitar e eu disse que a Paula passa o dia esperando a visita dela...
Este período preguiçoso nos leva obrigatoriamente a observar, refletir (podem rir...) e pior, escrever! Estamos ancorados entre algumas ilhas e noite dessas, em nosso plantao na proa olhando pro céu, notamos as rotinas ao nosso redor. A ilha mais a nordeste, Banedup, tem um gerador, bar, turistas e musica. Os kunas de lá sao todos fashion, cortes de cabelo, shorts, camisetas, acessórios moderninhos e curtem escutar regaton a todo volume noite adentro com as luzes todas acesas.
A nosso sudoeste, bem pertinho, Isla Perro, de onde a Mayelis vem nos visitar. Enquanto a festa rola em Banedup a Isla Perro já está imersa no mais profundo silencio e escuridao, com suas familias aconchegadas em suas cabanas.
E aqui bem no meinho, nós! Quanta oportunidade pra filosofar... Banedup querendo ser Sao Paulo, Sao Paulo buscando o sossego da Isla Perro e vai se saber o que o pessoal da Isla Perro quer.... Poupa-los-emos das nossas reflexoes, mas dá pra imaginar né? Muitas vezes quando estamos nas ilhas brincamos que se alguem nos visse diria que os moradores somos nós, de biquini e calçao e os turistas sao os kunas com cabelos transados, celulares e vestidos na moda... Ninguem tá nunca satisfeito, nao é mesmo?
Nosso bote inflável morreu. O danado está tão velho e furado que não tem mais salvação. Dá tanto trabalho encher que nem temos usado muito. As demais manutenções estamos fazendo a passo de tartaruga. Muito bom não ter pressa. Agora estou enrolando para ir ao tope do mastro (23 metros de altura) fixar as luzes de navegação. Já sei que vai ser um trabalho ingrato daqueles, ficar balançando, sol na moleira, uma mão pra se segurar e a outra para manejar furadeira, chave de fenda e aquele medo de deixar cair algo... Tentei convencer a Paula que seria uma boa experiência se ela fizesse isso pois eu me tornaria completamente obsoleto e desnecessário aqui no barco (afinal minha outra única responsabilidade digna de nota é lavar louça e ela poderia comprar uma máquina e livrar-se de mim definitivamente) mas não teve jeito. Ela tem andado tão entretida com a leitura de Drácula, Frankenstein, nadar, mergulhar com as arraias, fotografar o trânsito de Vênus frente ao sol (viram?) etc que nem me ouve.
Em poucos dias zarparemos para Cartagena, buscar o novo bote e pintar o fundo do barco. Nesse meio tempo temos as férias do gurizão, o resto ainda não sabemos. Mas já decidimos que voltaremos pra cá assim que possível!