A ancoragem em Bonaire é proibida. Os barcos são obrigados a permanecer em poitas, US$ 10 por dia. Tudo para preservar os corais e a paisagem submarina. A ilha gira em torno do turismo e do mergulho. Existem inúmeros pontos de mergulho catalogados e grande parte pode ser atingida pela orla. O pessoal vem de carro, estaciona, coloca o equipamento e tchibum. A água é incrivelmente azul, transparente e despoluída, mesmo em frente ao cais da cidade mergulhávamos com muitos peixes. A profundidade cresce rapidamente, pertíssimo da beira mar já está em 40 metros.
Além dos mergulhos pouco mais há para se ver ou fazer. Como o vento não ajudou não velejamos de kite nem wind. E o tal vento raro de sudoeste continuou a nos assombrar. E dessa vez veio com um swell, ficamos balançando vendo as ondas quebrarem na calçada poucos metros em nossa popa. Muitos relâmpagos. Desde Aves vínhamos assistindo tremendos espetáculos noturnos, ainda bem que muito distantes.
Um dia passa por nós um cara num bote, olha nosso gerador eólico com uma das pás faltando (quebrou no ventão em Aves) e diz que tem um jogo de pás novo, é só passarmos no seu barco e apanhar. No dia seguinte fui lá e o Glen tinha de fato as pás e nos deu. Retribuímos com uma garrafa de cachaça, o melhor que nos ocorreu. Um jogo de pás custa no mínimo US$ 100. A comunidade dos cruzeiristas é muito unida e todos fazem questão de se ajudar. Nós mesmos já havíamos dado coisas para pessoas que mal conhecíamos. As pessoas se comportam em geral de uma maneira muito diferente do que na cidade. São mais simpáticas, desinteressadas, dispõem de mais tempo e vontade para ajudar e fazer amizades.
Curacao
Depois de uma semana em Bonaire motoramos para Curaçao. Ancoramos em Spanish Waters, uma grande baia cheia de reentrâncias e canais. A entrada é muito estreita, provavelmente menos de 50 metros. A gente passa pertinho dos corais, navega por um canal sinuoso e só aí entra na baia. Muito agradável e protegida. As margens estão bastante tomadas por grandes casas e marinas. As ancoragens são delimitadas, não se pode ancorar em qualquer lugar. A água dentro da baía é turva, esverdeada. Um dos barcos fornece internet wifi por US$ 10/semana. Em uma das marinas o microônibus de um supermercado leva e traz gratuitamente os cruzeiristas para as compras. Os supermercados são muito bem abastecidos com produtos europeus, americanos e latino-americanos. Vinhos chilenos saem por menos da metade do preço no Brasil.
Curacao deve este nome aos antigos navegadores portugueses, que aqui aportavam em busca de alimentos e descanso para combaterem o escorbuto e outras doenças típicas. Aqui se curavam e assim a denominaram Ilha da Curação. Com o domínio holandês virou Curacao. Hoje com mais de 150 mil habitantes tem uma grande refinaria de petróleo e montes de KFC, Pizza Hut, McDonald`s.
A língua local é o papiamento, uma mistura de português, holandês, espanhol (hoje em dia também tem palavras em inglês, como todas as outras línguas do mundo). Nas escolas ensina-se - mas nem sempre se aprende - o holandês, inglês, espanhol e papiamento. O papiamento é o máximo. Consegue-se entender um monte de coisas. Nos divertimos muito lendo placas e manchetes de jornais.
Junto com o Milo One alugamos um carro e demos uma volta pela ilha.
Poucas praias, muito bonitas. O centro da cidade é muito bem cuidado, com todos os prédios baixos e pintados em cores vivas margeando o canal de acesso a baía de Willemstad, onde está a tal refinaria. Existem duas pontes sobre esse canal. Uma moderna, muito alta e uma antiga – século 19, que é flutuante e tem motores em uma das extremidades e dobradiças na outra. Quando alguma embarcação quer passar um dos lados da ponte se move dando acesso ao canal. O Elio foi muito gentil e filmou o Pajé passando por aqui.
Poucos dias após nossa chegada lá vem o Elio e seu Crapun novamente. Digo novamente pois a coisa já tá virando brincadeira. Por diversas vezes o Elio chega às mesmas ancoragens onde estamos sem termos combinado nada. E nessas ocasiões, claro, vamos recebê-lo alegremente e ajudamos na ancoragem, indicando onde está a imigração, supermercado e/ou convidando-o para jantar. E aí ficamos brincando que viramos os batedores do Crapun, comitiva de boas vindas, etc.
Tivemos o prazer de conhecer os brasileiros Iris e Alexandre, do veleiro Ubatuba. Estão velejando desde os EUA e ficarão em Curacao por um tempo antes de seguir viagem. Simpaticíssimos, logo estávamos todos entrosados e curtindo passeios e refeições pela ilha.
Um barato o Elio e o Alexandre. Dois excelentes contadores de causos. Elio com suas histórias de físico, professor e motociclista. Alexandre com suas histórias de caçador e pescador. Sabiam que se algum dia você, sua mulher, amigo ou cachorro for apanhado por uma sucuri basta passar suas unhas no sentido contrário das “escamas” da cobra que ela sai correndo? Estou esperando minha sogra aparecer por aqui para fazer o teste. Tomara que ela me solte logo!
Como estava indo tudo muito bem resolvemos complicar um pouco e pintar o fundo do barco. Comparamos os preços com as marinas do Panamá e Colômbia e decidimos por Curacao. Combinamos a retirada do barco numa segunda-feira cedo e que o pessoal da marina daria uma lixada no fundo e nós faríamos a pintura. Bom, nos envolvemos num drama que vai completar 4 semanas. Acabamos fazendo um hydroblast (jatos de água em altíssima pressão) e retiramos TODA a pintura do Pajé. O costado agora está com o alumínio aparente, modelito 2009. Só que para chegar nesse ponto foi o sofrimento... Já ouviram falar de inferno brasileiro? Pois é, o inferno agora tá globalizado.
A solidariedade da Iris, Alexandre e Elio nessa fase atribulada foi inestimável. Fomos a uma enorme caverna cheia de morcegos, estalactites e estalagmites. Mergulhamos num naufrágio de um pequeno rebocador e saboreamos uma feijoada no cockpit do Ubatuba.
Outra agradável ajuda veio com a visita do Bernard e do Emílio que também nos animaram, distraíram, alimentaram e levaram pra passear. Ficamos devendo uma estadia mais acolhedora aos dois, com o barco na água de preferência.
Se sobrevivermos, vamos para uma rápida escala em Aruba e depois Colômbia, onde Mamita e Papito nos esperam. Nina recuperando-se de uma fratura no fêmur ocorrida em caliente noite de paixão e Cláudio abastecendo sua adega para melhor receber a combalida e sedenta tripulação do Pajé.